Mercantilismo é um conjunto de práticas econômicas desenvolvido na Europa na Idade Moderna, entre o século XV e o final do século XVIII. O mercantilismo originou um conjunto de medidas econômicas diversas de acordo com os Estados. Caracterizou-se por uma forte intervenção do Estado na economia. Consistiu numa série de medidas tendentes a unificar o mercado interno e teve como finalidade a formação de fortes Estados-nacionais.
É possível distinguir três modelos principais: balança comercial favorável, pacto colonial e protecionismo. Segundo William Holman Hunt, o mercantilismo originou-se no período em que a Europa estava a passar por uma grave escassez de ouro e prata, não tendo, portanto, dinheiro suficiente para atender ao volume crescente do comércio.
As políticas mercantilistas partilhavam a crença de que a riqueza de uma nação residia na acumulação de metais preciosos (ouro e prata), advogando que estes se atrairiam através do incremento das exportações e da restrição das importações (procura de uma balança comercial favorável). Essa crença é conhecida como bulionismo ou metalismo.
O Estado desempenha um papel intervencionista na economia, implantando novas indústrias protegidas pelo aumento dos direitos alfandegários sobre as importações, (protecionismo), controlando os consumos internos de determinados produtos, melhorando as infra-estruturas e promovendo a colonização de novos territórios (monopólio), entendidos como forma de garantir o acesso a matérias-primas e o escoamento de produtos manufaturados. A forte regulamentação da economia pelo mercantilismo será contestada na segunda metade do século XVIII por François Quesnay e pelo movimento dos fisiocratas.
O mercantilismo é um conjunto de ideias econômicas que considera a prosperidade de uma nação ou Estado dependente do capital que possa ter. Os pensadores mercantilistas preconizam o desenvolvimento econômico por meio do enriquecimento das nações graças ao comércio exterior, o que permite encontrar saída aos excedentes da produção. O Estado adquire um papel primordial no desenvolvimento da riqueza nacional, ao adotar políticas protecionistas, e em particular estabelecendo barreiras tarifárias e medidas de apoio à exportação.
Os princípios mercantilistas eram os seguintes:
Incentivos às manufaturas: O governo estimulava o desenvolvimento de manufaturas em seus territórios. Como o produto manufaturado era mais caro do que as matérias-primas ou gêneros agrícolas, sua exportação era certeza de bons lucros.
Protecionismo alfandegário: O governo de uma nação deve aplicar uma política protecionista sobre a sua economia, favorecendo a exportação e desfavorecendo a importação, sobretudo mediante a imposição de tarifas alfandegárias. Incentiva-se, portanto, a balança comercial positiva com outras nações. Eram criados impostos e taxas para evitar ao máximo a entrada de produtos vindos do exterior. Era uma forma de estimular a indústria e manufaturas nacionais e também evitar a saída de moedas para outros países.
Balança comercial favorável: O esforço era para exportar mais do que importar, desta forma os ingressos de moeda seriam superiores às saídas, deixando em boa situação financeira.
Soma zero: Acredita que o volume global do comércio mundial é inalterável. Os mercantilistas viam o sistema econômico como um jogo de soma zero, no qual o lucro de uma das partes implica a perda da outra.
Colônias de exploração: A riqueza de um país está diretamente ligada à quantidade de colônias de que dispunha para exploração. O mercantilismo indiretamente impulsionou muitas das guerras europeias do período e serviu como causa e fundamento do imperialismo europeu, dado que as grandes potências da Europa lutavam pelo controlo dos mercados disponíveis no mundo. Sob este aspecto, vale salientar que, nas expansões marítimas e comerciais das nações, um país não poderia invadir o caminho percorrido constantemente por outro, como no caso da procura pelas Índias Ocidentais. Isto perdurou até que, após o descobrimento da América, a Inglaterra decidiu "trilhar" o seu próprio caminho. Portugal e Espanha se mostraram insatisfeitos com o fato, o que motivou a célebre frase do rei da Inglaterra:
O sol brilha para todos! E eu desconheço a cláusula do testamento de Adão que dividiu a terra entre portugueses e espanhóis.
Comércio colonial monopolizado pela metrópole: As colônias europeias deveriam comercializar exclusivamente com suas respectivas metrópoles. Para as metrópoles tratava-se de vender caro e comprar barato. Dentro desse contexto ocorreu o ciclo do açúcar no Brasil Colonial.
O mercantilismo enquadra-se historicamente na Idade Moderna, com a progressiva autonomia da economia frente à moral e a religião bem como frente à política. Esta enorme ruptura realizar-se-á por meio de conselheiros dos governantes e pelos comerciantes.[3] Esta nova disciplina chegará a ser uma verdadeira ciência econômica com a fisiocracia. Entre os muitos autores mercantilistas, há que destacar a Martín de Azpilicueta (1492-1586), Tomás de Mercado (1525-1575), Jean Bodin (1530–1596), Antoine de Montchrétien (1576–1621), ou William Petty (1623–1687).
O mercantilismo foi a teoria predominante ao longo de toda a Idade Moderna (do século XVI ao XVIII), época que aproximadamente indica o surgimento da ideia do Estado-nação e a formação econômico social conhecida como Antigo Regime na Europa Ocidental. Marca o final da proeminência da ideologia econômica do cristianismo (a crematística), inspirada em Aristóteles e Platão, que recusava a acumulação de riquezas e os empréstimos com juros (vinculados ao pecado da usura). Numa época que os reis desejavam possuir o máximo de ouro possível, as teorias mercantilistas buscavam esse objetivo e desenvolviam uma problemática baseada no enriquecimento, com base numa análise simplificada dos fluxos econômicos, em que, por exemplo, não se leva em conta o papel do sistema social.
Como agente unificador tendente à criação de um Estado nacional soberano, o mercantilismo contrapõe-se a duas forças: a primeira, mais espiritual e jurídica do que político-econômica, era constituída pelos poderes universais: a Igreja e o Sacro Império Romano Germânico; a segunda, de caráter predominantemente econômico foi o particularismo local, com a dificuldade que produz para as comunicações e a sobrevivência da economia natural (em determinadas zonas as rendas do Estado eram em espécie e não em dinheiro), enquanto a pretensão mercantilista era de que o mercado fechado fosse substituído pelo mercado nacional, e as mercadorias fossem substituídas por ouro, como medida de valor e meio de troca. O mercantilismo vê a intervenção do Estado como o meio mais eficaz para o desenvolvimento econômico.
Outra tendência do mercantilismo era fortalecer o poder do Estado no exterior, subordinando a atividade econômica a esse objetivo, e interessando-se pela riqueza enquanto servisse como base para isso. O liberalismo considerará a riqueza como preciosa para o indivíduo e, portanto, digna de ser atingida como um fim em si mesmo: se o particular não deve pensar em nada mais senão em enriquecer, é um fato puramente natural e involuntário que a riqueza dos cidadãos contribua para aumentar a riqueza do Estado. Por outro lado, para os mercantilistas, a riqueza privada é simplesmente um meio, e como tal fica subordinado ao Estado e aos seus fins de domínio.
A confiança no mercantilismo começou a decair em finais do século XVIII, quando as teorias de Adam Smith e de outros economistas clássicos foram ganhando prestígio no Império Britânico e, em menor grau, no restante da Europa (exceto na Alemanha, onde a Escola Histórica de Economia foi a mais importante durante todo o século XIX e começo do XX).[4] Adam Smith, na sua obra "A riqueza das nações", critica o mercantilismo com dureza, qualificando-o como uma "economia ao serviço do Príncipe". Curiosamente, embora tenha sido uma antiga colônia britânica, os Estados Unidos não aderiram à economia clássica. Em vez disso, adotaram uma forma de neomercantilismo preconizada pela chamada "escola americana" - organizada em torno das políticas de Alexander Hamilton, Henry Clay e Abraham Lincoln, as quais posteriormente seriam defendidas pelo Partido Republicano. Essa corrente seria dominante nos EUA até ao surgimento do New Deal, após a crise de 1929. A escola americana também influenciaria os economistas da Escola Histórica de Economia, como Friedrich List.
Atualmente a teoria do mercantilismo é recusada pela maioria dos economistas, se bem que alguns dos seus elementos sejam ocasionalmente vistos de modo positivo por alguns, entre os quais cabe citar a Ravi Batra, Pat Choate, Eammon Fingleton, ou Michael Linda.
Quase todos os economistas europeus dentre 1500 e 1750 são considerados atualmente como mercantilistas. Contudo, estes autores não se consideravam partícipes de uma única ideologia econômica. O termo só foi inventado em 1763, por Vitor Riquetti Marquês de Mirabeau, e popularizado por Adam Smith, em 1776. O termo mercantilismo foi criado a partir da palavra latina mercari, que significa mercantil, no sentido de levar a cabo um negócio, e que procede da raiz merx que significa mercadoria. De início foi usado apenas por críticos, como Mirabeau e o próprio Smith, mas foi logo adotada pelos historiadores.De fato, Smith foi quem primeiro organizou formalmente muitas das contribuições dos mercantilistas no seu livro A Riqueza das Nações.
O mercantilismo em si não pode ser considerado como uma teoria unificada de economia. Na realidade não houve escritores mercantilistas que apresentassem um esquema geral do que seria uma economia ideal, tal como Adam Smith faria mais adiante para a economia clássica. O escritor mercantilista tendia a concentrar a sua atenção numa área específica da economia. Somente após o período mercantilista é que estudiosos, como Eli F. Heckscher, integrariam as diversas ideias no que chamariam mercantilismo. Heckscher vê, nos escritos da época, um sistema de poder político e, ao mesmo tempo, um sistema de regulamentação da atividade econômica, um sistema protecionista e um sistema monetário com a teoria da balança comercial. Contudo, alguns teóricos recusam completamente a ideia mesma de uma teoria mercantilista, alegando que esta dá "uma falsa unidade a fatos díspares". O historiador do pensamento econômico Mark Blaug faz notar que o mercantilismo foi qualificado posteriormente como "bagagem incômoda", "diversão de historiografia", e de "gigantesco globo teórico".
Até certo ponto, a doutrina mercantilista, em si mesma, tornava impossível a existência de uma teoria geral da economia. Os mercantilistas viam o sistema econômico como um jogo de soma zero, onde a ganância de uma das partes supunha a perda da outra ou, seguindo a famosa máxima de Jean Bodin, "não há nada que alguém ganhe e que outrem não perca". Assim, por definição, qualquer sistema político que beneficiasse a um grupo faria dano a outro (ou outros), não existindo a possibilidade de a economia servir para maximizar a riqueza comum ou para o bem comum. Aparentemente, os escritos dos mercantilistas foram feitos mais para justificar a posteriori uma série de práticas, do que para avaliar o impacto dessas práticas e determinar o melhor modo de implementá-las.
O mercantilismo é, portanto, uma doutrina ou política econômica que aparece num período intervencionista e descreve um credo econômico que prevaleceu à época de nascimento do capitalismo, antes da Revolução Industrial.
As primeiras teorias mercantilistas desenvolvidas a princípios do Século XVI estiveram pontuadas pelo bullionismo. A esse respeito, Adam Smith escrevia:
“A dupla função que cumpre o Dinheiro, como instrumento de comércio e como medida dos valores, fez com que se produza de jeito natural essa ideia popular de que o Dinheiro faz a riqueza, ou que a riqueza consiste na abundância de ouro e prata [...]. Razoa-se do mesmo jeito com referência a um país. Um país rico é aquele no que abunda o dinheiro, e o meio mais simples de enriquecer o seu, é amassar o ouro e a prata [...]. Devido ao crescente sucesso destas ideias, as diferentes nações da Europa dedicaram-se, embora sem sucesso suficiente, a buscar e acumular ouro e prata de todas as maneiras possíveis. Espanha e Portugal, possuidoras das principais minas que provêm à Europa desses metais, proibiram a sua exportação ameaçando com graves represálias, ou submeteram-na a enormes taxas. Esta mesma proibição fez parte da política da maioria das nações da Europa. É encontrada mesmo onde menos se aguardaria, em algumas antigas atas do parlamento da Escócia, que proíbem, sob fortes penas, transportar ouro e prata fora do reino. A mesma política pôs-se em prática na França e na Inglaterra”.
Durante esse período, importantes quantidades de ouro e prata fluíam desde as colônias espanholas do Novo Mundo para a Europa. Para os escritores bullionistas, como Jean Bodin ou Thomas Gresham, a riqueza e o poder do Estado medem-se pela quantidade de ouro que possuem. Cada nação deve, pois, acrescentar as suas reservas de ouro à custa das demais nações para fazer crescer o seu poder. A prosperidade de um Estado mede-se, segundo os bullionistas, pela riqueza acumulada pelo governo, sem mencionar a Renda Nacional. Este interesse para as reservas de ouro e prata é explicado em parte pela importância dessas matérias-primas na época de guerra. Os exércitos, que contavam com muitos mercenários, eram pagos com ouro e exceto os poucos países europeus que controlavam as minas de ouro e prata, a principal maneira de obter essas matérias-primas era o comércio internacional. Se um Estado exportava mais do que importava, a sua "balança do comércio" (o que corresponde atualmente à balança comercial) era excedentária, o qual se traduzia numa entrada neta de dinheiro.
Isto levou os mercantilistas a propor como objetivo econômico o de ter um excedente comercial. Era estritamente proibida a exportação de ouro. Os bullionistas também eram partidários de altas taxas de juros para animar os investidores a investir o seu dinheiro no país.
No Século XVIII foi desenvolvida uma versão mais elaborada das ideias mercantilistas, que recusava a visão simplista do bullionismo. Esses escritores, como Thomas Mun, situavam como principal objetivo o crescimento da riqueza nacional, e embora continuavam considerando que o ouro era a riqueza principal, admitiam que existiam outras fontes de riqueza, como as mercadorias.
“(…) não é a grande quantidade de ouro e prata o que constitui a verdadeira riqueza de um Estado, já que no mundo há países muito grandes que contam com abundância de ouro e prata, e que não se encontram mais cômodos, nem são mais felizes [...]. A verdadeira riqueza de um Reino consiste na abundância das Mercancias, cujo uso é tão necessário para o sustento da vida dos homens, que não podem passar delas".
O objetivo de uma balança comercial excedentária continuava a ser perseguido, mas desde esse momento era visto interessante importar mercadorias da Ásia por meio de ouro para revender depois esses bens no mercado europeu com importantes benefícios.
“E para deixar a coisa ainda mais clara, quando dizemos [...] que 100 mil libras exportadas em efetivo podem servir para importar o equivalente aproximado de 500 mil libras esterlinas em mercadorias das Índias Orientais, há que entender que a parte dessa soma que pode chamar-se com propriedade a nossa importação, ao ser consumida no reino, tem um valor de umas 120 mil libras esterlinas anuais. De maneira que o resto, é dizer 380 mil libras, é mercadoria exportada ao estrangeiro sob a forma do nossos tecidos, o nosso chumbo, o nosso estanho, ou de qualquer outro produto do nosso país, com grande aumento do patrimônio e isso no tesouro do reino, pelo qual podemos concluir que o comércio das Índias Orientais prove a esse fim.”
Esta nova visão recusava a partir desse momento a exportação de matérias-primas, que uma vez transformadas em bens finais constituíam uma importante fonte de riqueza. Enquanto o bullionismo favorecera a exportação massiva de lã de Grã-Bretanha, a nova geração de mercantilistas apoiava a proibição total de exportar matérias-primas e propugnava o desenvolvimento de indústrias manufatureiras domésticas. Ao precisar as indústrias importantes capitais, no Século XVIII houve uma redução das limitações contra a usura. Como muito bem demonstrou William Petty, a taxa de interesse vê-se como uma compensação pelas moléstias ocasionadas ao prestador ao ficar sem liquidez. Um resultado dessas teorias foi a posta em prática das Navigation Acts a partir de 1651, que deram aos barcos ingleses a exclusiva nas relações entre Grã-Bretanha e as suas colônias, proibindo aos holandeses o acesso a certos portos para restringir a expansão dos Países Baixos.
As consequências em matéria de política interior das teorias mercantilistas estavam muito mais fragmentadas do que os seus aspetos de política comercial. Enquanto Adam Smith dizia que o mercantilismo apelava a controlos muito estritos da economia, os mercantilistas não concordavam entre si. Alguns propugnavam a criação de monopólios e outras cartas patentes. Mas outros criticavam o risco de corrupção e de ineficácia de tais sistemas. Muitos mercantilistas também reconheciam que a instauração de quotas e de controlo dos preços propiciava o mercado negro.
Por outro lado, a maior parte dos teóricos mercantilistas estavam de acordo na opressão econômica dos operários e agricultores que deviam viver com uma renda perto do nível de sobrevivência, para maximizar a produção. Uma maior renda, tempo de lazer suplementar ou uma melhor educação dessas populações contribuiriam para favorecer a folgança e prejudicariam a economia. Esses pensadores viam uma dupla vantagem no fato de dispor de abundante mão-de-obra: as indústrias desenvolvidas nessa época precisavam de muita mão-de-obra e, ademais, isso reforçava o potencial militar do país. Os salários eram mantidos, portanto, em um baixo nível para incitar a trabalhar. As leis de pobres (Poor Laws) em Inglaterra perseguem os vagabundos e fazem obrigatório o trabalho. O ministro Colbert fará trabalhar as crianças com seis anos nas manufaturas do Estado.
A reflexão sobre a pobreza e o seu papel social na Idade Moderna cobrou importância, sobretudo após a Reforma Protestante e os diferentes papéis que à predestinação e o triunfo pessoal davam a teologia de Lutero, Calvino ou a Contra-reforma. A opinião católica tradicional associava-se ao mantimento do Antigo Regime, sancionando o lazer dos privilegiados e considerando a condenação do trabalho como um castigo divino, enquanto as sociedades onde triunfou o protestantismo pareciam adequar-se mais aos novos valores burgueses. Tradicionalmente os pobres eram vistos como os mais próximos a Deus, e as instituições de caridade não se viam como meios de erradicar a pobreza, senão de paliar os seus efeitos. Porém, entre os católicos também se inclui a obra de Juan Luis Vives De subventione pauperum. Sive de humanis necessitatibus libri II (Os dois livros da subvenção aos pobres ou da necessidade humana. Bruxas, 1525), que trata o problema da mendicidade procurando soluções nas instituições públicas, que devem socorrer os verdadeiros pobres e fazer trabalhar aos que somente são vagos; para isso considerava precisa uma organização da beneficência e uma reforma do sistema sanitário, de asilo. Seguindo as suas ideias foi organizada a atuação contra a pobreza na cidade de Bruxas.
Em efeito, não se pode falar de uma escola mercantilista, pois, para poder falar de uma escola deve existir uma série de características como a presença de um mestre que crie um pensamento que seja seguido pelos membros da escola, além de homogeneidade no pensamento. Assim, por exemplo, podemos falar da Escola Clássica com Adam Smith como epicentro do pensamento, ou seja, como mestre, e a afinidade entre os diferentes autores da mesma. No caso do pensamento chamado mercantilista não encontramos nenhum dos atributos necessários para identificá-lo com uma escola de pensamento.
O mercantilismo teve diversas interpretações ao longo do tempo. Desde Adam Smith até o presente sucedem-se explicações do que foram e significaram todos estes autores chamados mercantilistas. John Maynard Keynes, Gustav Schmoller, William Cunningham e o já mencionado Adam Smith, entre muitos outros, achegaram a sua perspectiva do mercantilismo. É assinalado particularmente Eli Heckscher que, influenciado pelos três últimos autores mencionados, reúne as interpretações destes para logo acrescentar a sua. Fala do mercantilismo do ponto de vista da sua política protecionista e as suas atitudes monetárias (como já refere Smith), como uma doutrina na construção do Estado (recolhido de Schmoller), como um sistema de poder (propugnado por Cunningham) e acrescenta a sua tese a estas quatro: descreve o mercantilismo como uma concepção social que quebrou com as formas, tanto morais quanto religiosas, que determinavam o comportamento dos agentes econômicos.
Destaca-se Cantillon entre os autores que acreditam que o mercantilismo é a antecipação da doutrina clássica. Este autor, entre o pensamento mercantilista e clássico, aperfeiçoa o conceito de "balança de comércio" em termos de trabalho. Desta óptica é levado em conta o aumento do emprego como término positivo nas ganâncias da balança comercial. Assim, pois, Cantillon, advoga por medidas de estabilidade dos preços e impedir a sua subida (pela acumulação do dinheiro) e, em consequência, a sobrevivência de um nível alto de emprego.
O conceito de mercantilismo define-se a partir dos grandes Descobrimentos, consequência da abertura das rotas comerciais marítimas pelos portugueses entre o século XV e 1500 (data do descobrimento do Brasil) e a consolidada corrente do metal precioso (ouro e prata nomeadamente) levado dos territórios novos para a Europa, em particular depois do estabelecimento dos vice-reinos da Nova Espanha e do Peru pelos castelhanos.
Intimamente ligado à emergência do Estado-nação moderno e baseado na existência do binômio "metrópole – colônias", o mercantilismo assumiu formas nacionais, das quais podem citar-se, em ordem cronológica: Portugal, Espanha, Inglaterra, Holanda, França, Dinamarca e Suécia durante os séculos XVI, XVII e XVIII. Nesta época, o mercantilismo evolui de tal maneira que gera um estudo apropriado e traduz-se como uma atividade econômica, em tal grau que se fala de políticas econômicas e normas econômicas. O mercantilismo começa a ser conhecido com outras denominações, as mesmas que dão senso ao seu conceito: sistema mercantil, sistema restritivo, sistema comercial, colbertismo na França e cameralismo na Alemanha.
Derivado da expansão militar europeia e do incipiente desenvolvimento manufatureiro, como complemento da produção clássica da agricultura, o mercantilismo incrementou notavelmente o comércio internacional. Os mercantilistas foram os primeiros em identificar a importância monetária e política deste.
O mercantilismo desenvolveu-se numa época na que a economia europeia estava em transição do feudalismo ao capitalismo. As monarquias feudais medievais estavam sendo substituídas pelas novas nações-estado centralizadas, em forma de monarquias absolutas ou (em Inglaterra e Holanda) parlamentares. Os câmbios tecnológicos na navegação e o crescimento dos núcleos urbanos também contribuíram decisivamente ao rápido acréscimo do comércio internacional. O mercantilismo focava em como este comércio podia ajudar melhor os Estados.
Outro câmbio importante foi a introdução da contabilidade moderna e as técnicas de dupla entrada. A nova contabilidade permitia levar um claro seguimento do comércio, contribuindo para a possibilidade de fiscalizar a balança de comércio. E evidentemente, também não se pode ignorar o impacto do descobrimento da América. Os novos mercados e minas descobertas impulsionaram o comércio exterior a cifras até não concebidas. Isto levou a um grande acréscimo dos preços e a um acréscimo na própria atividade comercial. Curiosamente, a relação entre a chegada de metais preciosos americanos e a inflação europeia do século XVI (um fenômeno a uma escala até então desconhecida) não foi plenamente estabelecido até as pesquisas de Earl J. Hamilton numa data tão tardia quanto 1934 (O tesouro americano e a revolução dos preços na Espanha, 1501-1650).
Antes do mercantilismo, os estudos econômicos mais importantes realizados na Europa foram as teorias da Escolástica medieval. O objetivo destes pensadores era encontrar um sistema econômico que fosse compatível com as doutrinas cristãs com respeito à piedade e a justiça. Eram centrados nomeadamente nas questões microeconômicas e nas trocas locais entre indivíduos. O mercantilismo, por sua vez, estava alinhado com as outras teorias e ideias que estavam substituindo o ponto de vista medieval.
Nesta época foram adotadas também as teorias da Realpolitik impulsionadas por Nicolau Maquiavel e a primazia do interesse nacional nas relações internacionais. A ideia mercantilista de o comércio ser uma soma zero na qual cada parte fazia o possível para ganhar numa dura concorrência, integrava-se dentro das teorias filosóficas de Thomas Hobbes. Os jogos de soma zero, como o dilema do prisioneiro, podem ser consistentes com um ponto de vista mercantilista. No mencionado dilema, os jogadores são premiados por atraiçoar os seus companheiros, embora todos ficassem melhor se todos cooperassem.
Esse ponto de vista pessimista sobre a natureza humana também se encaixa na visão de mundo puritana, que inspirou parte da legislação mercantilista mais dura, como as Atos de Navegação (Navigation Acts) introduzidos pelo governo de Oliver Cromwell.
O pensamento mercantilista pode ser sintetizado através das nove regras de Von Hornick:
Que cada polegada do chão de um país seja utilizada para a agricultura, a mineração ou as manufaturas;
Todas as matérias que se encontrem num país sejam utilizadas nas manufaturas nacionais, porque os bens acabados têm um valor maior que as matérias-primas;
Que seja fomentada uma população grande e trabalhadora;
Que sejam proibidas todas as exportações de ouro e prata e que todo o dinheiro nacional seja mantido em circulação;
Que seja obstaculizado tanto quanto for possível todas as importações de bens estrangeiros;
Que onde sejam indispensáveis determinadas importações devam ser obtidas de primeira mão, em troca de outros bens nacionais, e não de ouro e prata;
Que na medida em que for possível, as importações sejam limitadas às primeiras matérias que possam acabar-se no país;
Que sejam procuradas constantemente as oportunidades para vender o excedente de manufaturas de um país aos estrangeiros, na medida necessária, em troca de ouro e prata;
Que não seja permitida nenhuma importação se os bens que se importam existissem suficiente e adequadamente no país.
Contudo, a política econômica interna que defende o mercantilismo estava ainda mais fragmentada do que a internacional. Enquanto Adam Smith apresentava um mercantilismo que apoiava o controlo estrito da economia, muitos mercantilistas não se identificavam com tais ideias. Durante os começos da era moderna estava na ordem do dia o uso das patentes reais e a imposição governamental de monopólios. Alguns mercantilistas apoiavam-nos, enquanto outros viam a corrupção e ineficiência desses sistemas.
Um dos elementos nos quais os mercantilistas estavam de acordo era a opressão econômica dos trabalhadores. Os assalariados e os granjeiros deviam viver nas "margens de subsistência". O objetivo era maximizar a produção, sem nenhum tipo de atenção sobre o consumo. O fato de as classes mais baixas terem mais dinheiro, tempo de lazer, ou educação era visto como um problema que degeneraria em poucos ganhos do trabalho, prejudicando a economia do país.
Por outro lado, os estudiosos não se põem de acordo no motivo pelo qual o mercantilismo foi a ideologia ou teoria econômica dominante durante dois séculos e meio. Um grupo, representado por Jacob Viner, argumenta que o mercantilismo foi simplesmente um sistema muito direto e que contava com senso comum. Contudo, sustentava-se sobre uma série de falácias lógicas que não podiam ser descobertas pelas pessoas da época, dado que não tinham as ferramentas analíticas necessárias. Outra escola, apoiada por economistas como Robert B. Ekelund, entende que o mercantilismo não era um erro, mas o melhor sistema possível para aqueles que o desenvolveram. Esta escola argumenta que as políticas mercantilistas foram desenvolvidas e postas em prática por comerciantes e governos, cujo objetivo era incrementar ao máximo os benefícios empresariais. Os empresários beneficiavam-se enormemente, e sem que isso lhes supusesse um esforço, pela imposição de monopólios, as proibições às importações e a pobreza dos trabalhadores. Os governos, pela sua vez, beneficiavam-se do cobro das tarifas alfandegárias e os pagamentos dos mercadores. Se bem que as ideias econômicas mais tardias foram desenvolvidas com freqüência por acadêmicos e filósofos, quase todos os escritores mercantilistas eram comerciantes ou pessoas com cargos no Governo.
Dentro da doutrina econômica mercantilista emergiram, de maneira natural, três questões fundamentais que gerava esta lucrativa atividade comercial:
O monopólio da exportação;
O problema dos câmbios e a sua derivação;
O problema da balança comercial.
Na obra The Circle of Commerce (O Círculo do Comércio, 1623), Edward Misselden desenvolveu um conceito de balança comercial expressado em termos de débitos e créditos, apresentando o cálculo da balança comercial para a Inglaterra do dia de Natal de 1621 até o de 1622.