A Crise do Sistema Colonial decorreu, em grande medida, da expansão do pensamento ilustrado pelo Ocidente. Pode-se dizer que os conflitos que modificaram radicalmente as relações entre as Américas e suas metrópoles europeias decorreram da própria crise da Modernidade no despontar da Revolução Francesa. Conceitos como liberdade, igualdade e fraternidade encontraram, na América, um ambiente propício ao desenvolvimento de modelos políticos críticos ao embaraçoso sistema colonial. É bem verdade que os processos de independência, como no caso do Brasil, não romperam de forma radical com os modelos econômicos vigentes. O sistema escravocrata financiado pelas elites latifundiárias e monocultoras, apesar do frágil diálogo com a ideia de civilização, amplamente defendida no despontar dos séculos XVIII e XIX, estabeleciam as bases para uma autonomia político-econômica mascarada pelos discursos de independência social. A evidencia do fortalecimento de sociedades coloniais, através do surgimento de elites locais, levou metrópoles como Inglaterra, Espanha e Portugal a implementarem estratégias políticas, fiscais e econômicas compulsórias, na tentativa de resistir ao emergente processo de independências das colônias americanas.
Nas Colônias do Norte, a Inglaterra estabelecia uma política colonial restritiva, impondo medidas de controle comercial às Treze Colônias impulsionando a luta pela independência. Apesar da vitória na Guerra dos Sete Anos (1756-1763) ter expandido os domínios ingleses, o custo da guerra teria sido alto demais para seus cofres, o que levou à criação de leis tributárias que aumentaram de modo significativo os impostos sobre as Treze Colônias. Reações posteriores levaram a Inglaterra a suspender algumas destas leis e diminuir taxas sobre a exportação do açúcar. O ato que ficou conhecido como Festa do Chá de Boston (1773), onde carregamentos de chá trazidos pela Companhia das Índias Orientais foram jogados ao mar pelos colonos, evidenciava o desgaste entre a Inglaterra e suas colônias. Respondendo ao evento ocorrido em Boston, o Parlamento Inglês aprovou, em 1774, as Leis Intoleráveis que impunham novas sanções às Treze Colônias. Os colonos reagiram mais uma vez promovendo os Congressos Continentais da Filadélfia, dos quais resultaram a Declaração da Independência de 1776. Em 1783, a Inglaterra reconheceu a Independência dos Estados Unidos. Em 1787, foi aprovada a Constituição dos Estados Unidos, na qual a liberdade e direitos dos cidadãos foi garantida, mas a escravidão ainda mantida.
Na América espanhola, com exceção do México, onde o movimento teve caráter fortemente popular, os processos de independência foram liderados pela elite criolla. O objetivo era consolidar o poder político e econômico da elite local. Os criollos não desejavam o rompimento com a ordem social vigente em seus territórios. Entendiam que a exploração compulsória do trabalho indígena e negro deveria ser mantida, já que constituíam a base da economia. No âmbito intelectual, os criollos defendiam princípios liberais, baseados na Independência dos Estados Unidos e na Revolução Francesa. A Coroa espanhola tentava a todo custo evitar que os ideais revolucionários chegassem às suas colônias, mas os princípios liberais circulavam pelas universidades na América. Em 1808, com a derrubada da Coroa espanhola por Napoleão Bonaparte, os movimentos de independência na América cresceram. As elites criollas aumentavam seus poderes à medida que não reconheciam a autoridade do Império Napoleônico sobre seus territórios. As colônias espanholas passaram a se rebelar quase que simultaneamente. Os movimentos começaram nas cidades e se espalharam pelos campos proclamando as independências na Argentina (1816), Chile (1818), Grã-Colômbia (atuais Colômbia, Venezuela, Equador e Panamá), Peru (1821), México (1823, após a criação de uma monarquia católica, em 1821) e Bolívia (1825). Todas foram antecedidas pela Revolução Haitiana, onde escravos negros influenciados pelas ideias de liberdade e igualdade da Revolução Francesa criaram, em 1804, a República do Haiti.
Na América portuguesa, as medidas adotadas no Período Pombalino aumentaram ainda mais a crise econômica e política. O fracasso do Marquês de Pombal em articular o Absolutismo Ilustrado com as bases mercantilistas acirrou ainda mais os ânimos coloniais na medida que crescia a arrecadação de impostos. Movimentos de caráter emancipacionista indicavam um caminho sem volta para a independência. Apesar dos mártires deixados pelas trilhas sangrentas das ciladas armadas pelo Estado Português, as resistências se tornaram uma constante, passando a fortalecer os ideais de um Estado Independente. Juntaram-se a essas instabilidades, o Terremoto de Lisboa (1755), a crise do comércio açucareiro e a queda na produção aurífera, além de crises sociais decorrentes de políticas administrativas implementadas no Estado do Grão-Pará e Maranhão, as quais resultaram na expulsão dos jesuítas e na tentativa de criação de uma economia agrícola em larga escala com a utilização da mão de obra indígena regulamentada pelo Diretório dos Índios. Apesar da disseminação das ideias francesas e norte-americanas, as reformas sociais foram controladas pelas elites. Após a queda de Pombal, conjurações de caráter emancipacionistas, mesmo em perspectivas locais, passaram a ocorrer em diferentes regiões.
Nas Minas Gerais, em 1789, uma crise econômica, resultante da escassez de ouro, aumentava as pressões da Coroa portuguesa pela cobrança do Quinto (100 arrobas anuais – valor equivalente à 1.468,9kg de ouro) através da execução da Derrama (cobrança compulsória dos Quintos em atraso – Invasão de cidades, vilas, fazendas e casas a procura de ouro para alcançar o valor do Quinto). Como resposta, a elite local pretendeu tomar o poder e instituir uma república através do fracassado evento denominado de Conjuração Mineira. A Conjuração Baiana, iniciada com as elites, em 1798, tomou projeções de caráter social, a partir do ingresso de mulatos, ex-escravos, homens brancos pobres, alfaiates, pedreiros, soldados e bordadores que passaram a defender a proclamação de uma república na Bahia, o fim da escravidão e das diferenças baseadas na cor da pele. Por estas razões, a conjuração acabou perdendo seu apoio maçônico e sucumbindo naquele mesmo ano.
Com a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil, em 1808, transformações de caráter econômico iniciaram o processo de independência econômica das colônias portuguesas. A Abertura dos Portos dava fim ao exclusivo colonial (principal aspecto que une uma colônia a sua metrópole), permitindo que as nações aliadas a Portugal (naquele momento, a Inglaterra) pudessem desenvolver relações comerciais com o Brasil e o Estado do Grão-Pará e Maranhão, anulando suas dependências econômicas unilaterais. A instalação de manufaturas, fundação do Banco do Brasil (1808), a invasão da Guiana Francesa (1808), elevação do Brasil à categoria de Reino Unido à Portugal e Algarves (1815), a Insurreição Pernambucana (1817) e a ocupação da Banda Oriental do Uruguai, após a Guerra contra Artigas (1816-1820), alteraram o lugar das colônias portuguesas no cenário intercontinental. Enfim, a Revolução do Porto (1820), decorrente de uma crise política em Portugal, concorreu para o enfraquecimento das relações com o Brasil e a consequente Proclamação da Independência, em 1822. Portanto, a Crise do Sistema Colonial deve ser pensado como evento de longa duração.
O termo “independência da América Espanhola” diz respeito ao processo de crescente ganho de autonomia das colônias espanholas em relação à metrópole europeia, ocorrido durante o início do século XIX.
Nas décadas finais do século XVIII, ocorreram as primeiras tentativas por parte das colônias em se libertar da Espanha. No Peru, por exemplo, se iniciaria uma grande revolta liderada pelo indígena conhecido como Túpac Amaru II contra a exploração brutal ocorrida nas minas. Eventualmente, a rebelião foi sufocada, mas isso não impediu a continuação da crise colonial nas Américas, motivada pela relação desigual que caracterizava a política mercantilista colonial.
Ao final do século, porém, a ascensão do general Napoleão Bonaparte ao poder modificou todo o panorama político com o início de suas investidas militares para expandir o poder francês na Europa. Após a invasão da Espanha e a deposição do rei da Casa Bourbon, Fernando VII, criaram-se as chamadas juntas nas colônias para se resistir a qualquer possível iniciativa francesa nas Américas. Entretanto, os descendentes de espanhóis nascidos no continente americano (melhor conhecidos como criollos) aproveitaram a oportunidade para enfraquecer algumas medidas mercantilistas.
Com a derrota definitiva de Napoleão Bonaparte em 1815 e à restituição do poder das monarquias absolutistas, a Espanha tentou controlar novamente suas colônias nas Américas. Embora tenha conseguido sucesso inicialmente com vitórias contra movimentos menores nas cidades de Bogotá e Caracas, a eventual reunião de massivo apoio popular por parte de líderes político-militares como Simón Bolívar e José de San Martin gerou um forte processo que, em poucas décadas, levaria à libertação de todas as colônias espanholas nas Américas.
Simón Bolívar nasceu em 24 de julho de 1783, no então vice-reino de Nova Granada, em uma família nobre de origem espanhola. Após estudar na Europa e ser influenciado pelos pensamentos revolucionários de origem iluminista, retornou ao país natal e juntou-se à luta contra a dominação colonial da Espanha, onde rapidamente assumiria um papel de liderança. Em 1811, um movimento de mestiços e escravos libertos com o apoio essencial da Inglaterra conseguiria a independência da Venezuela. Nos anos seguintes, também seriam libertados os territórios equivalentes aos atuais países de Bolívia, Colômbia, Equador e Panamá, que criaram uma união política nomeada de Grã-Colômbia. Ela duraria até 1829.
Já José de San Martin nasceu em 25 de fevereiro de 1778, no então vice-reino da Prata, também em uma família de origem espanhola. Quando ele ainda era uma criança, sua família retornou à Espanha, onde José iniciou sua educação militar. Poucos anos depois da deposição de Fernando VII, ele retornou às Américas, onde se uniu à resistência do vice-reino do Peru contra os franceses. Ali, ele se distinguiu como líder militar, estando depois à frente de uma campanha nos Andes que levaria à libertação do Chile em 1817, seguido em pouco tempo pelo Peru.
O México, especificamente, não dependeu de nenhum destes dois homens para alcançar a sua independência, que foi feita pelo próprio exército no início da década de 1820.
De qualquer forma, as ambições de uma América unida não foram realizadas; logo nos anos seguintes, conflitos entre oligarquias locais fragmentaram toda a Grã-Colômbia. Além disso, o apoio da Inglaterra à independência da América espanhola local não fora desinteressado, uma vez que esse país já via o potencial do grande mercado consumidor que o fim do pacto colonial poderia trazer. Por consequência, mesmo composta agora de países independentes, a América espanhola ainda estaria unida economicamente à Europa pelas décadas que se seguiriam, continuando a ser importadora de industrializados e exportadora de matérias-primas. Politicamente, os governos dos países independentes se apressaram a excluir qualquer participação popular maior, ficando retido às elites sociais. Esse processo abriria caminho para o surgimento, mais tarde, das ditaduras latino-americanas.
fonte: https://www.infoescola.com/historia/independencia-da-america-espanhola/ Acesso em: 10/02/2021